01-03-2010 - 10:16 | www.averdade.com
Aos 84 anos de idade, António Almeida Santos demonstrou em Baião a actualidade do seu pensamento e a vitalidade do seu raciocínio. Ao longo de quase duas horas de intervenção, este “senador” da política nacional defendeu a necessidade de um governo mundial, de uma redistribuição da riqueza mais justa e do fim das fronteiras entre as nações. O ciclo “Ideias Século XXI”, promovido pela autarquia, arrancou com um pensador livre: “As minhas ideias podem parecer erradas ou estranhas, mas vou continuar a defendê-las e estou certo de que muitas vão concretizar-se”.
Almeida Santos começou por relembrar a sua primeira visita ao concelho, após o 25 de Abril, altura em que visitou Santa Marinha do Zêzere. “Foi uma grande noite de intervenção política, que terminou com guitarradas e fados de Coimbra. Desde então guardo esta terra no meu coração”, confessou.
Ao lado de José Luís Carneiro e perante um Auditório Municipal com poucos lugares vagos, o antigo deputado, ministro e presidente da Assembleia da República criticou “a preponderância da escola mediática na formação do ser humano”. “Antigamente a escola clássica formava os cidadãos e transmitia valores. Hoje, com a televisão e com as novas tecnologias os cidadãos são formados por uma escola mediática. O cidadão é uma autarquia e vive com os valores e as convicções que bem entende”, referiu.
O presidente do Partido Socialista não é, porém, um crítico cego das novas tecnologias: “hoje em dia é fantástica a facilidade com que contactamos com alguém que está nos antípodas e no dia seguinte nos encontramos com ela”. O problema é mais, no entender de Almeida Santos, a degradação da democracia representativa em função da democracia directa. “O cidadão quer decidir por ele próprio e isso afasta as pessoas dos partidos e da política e mina a própria democracia”.
Num Mundo Globalizado pelas tecnologias e pela crescente proximidade entre cidadãos e culturas, Almeida Santos só vê lugar para soluções globais para os problemas globais. “Não saiu nada da crise que resolvesse as causas dela. O que necessitamos é de uma globalização política e de nos confederarmos. O problema não é o capitalismo, é a exploração e a má redistribuição da riqueza”, sintetizou. E lembrou de seguida o fim das fronteiras na União Europeia: “No dia em que as fronteiras foram abolidas eu estava em Trás-os-Montes. No dia seguinte decidi ir a Salamanca, em Espanha, e nem queria acreditar na facilidade com que passei de um país para o outro”. Para Almeida Santos mais regiões do globo deviam imitar o exemplo europeu e confederar-se: “é impossível e impensável haver guerras na Europa actualmente. Os estados percebem que mais vale fazer trocas comerciais e desenvolver competências supra-nacionais para problemas que já não são só nacionais ou regionais. Não são necessárias fronteiras nacionais, bastam as fronteiras jurídicas”.
Como exemplos de que algo está a mudar no panorama internacional, Almeida Santos citou o alargamento do grupo de discussão política que reúne as nações mais poderosas do planeta de oito para vinte membros; a emergência de um bloco de países não alinhados composto por Brasil, Rússia, Índia e China; e até mesmo a assunção, por parte do secretário-geral da ONU Ban Ki Moon, da necessidade de “um governo mundial”.
Almeida Santos alertou ainda para dois grandes problemas mundiais, que urge solucionar: o crescimento exponencial da população, que cresce à razão de 800 milhões por década, o que acarreta uma crescente necessidade de recursos e bens; e também o aquecimento global, que ameaça a biodiversidade e o equilíbrio dos ecossistemas.
Como problemas nacionais, o advogado natural de Seia, detectou a morosidade excessiva a justiça, em parte devido ao carácter “douto” da mesma. “É raro ver acórdãos dos tribunais com menos de 30 páginas. Isto não é eficaz”. Também a regionalização foi vista como uma evolução importante para o país, visto permitir uma melhor adequação das competências dos diferentes poderes. “O poder local só tem a ganhar com o surgimento de um poder regional, que esteja mais perto e seja mais acessível”, opinou, defendendo ainda a necessidade de revisão do mapa administrativo nacional. “Não faz sentido haver freguesias com 100 eleitores e 300 municípios. Precisamos de um novo Mouzinho da Silveira que adeqúe a administração do território às necessidades da população”.
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